Espaço de troca
uma pausa no almoço de segunda-feira para dividir umas coisas aleatórias com você
Há tempos não fazia uma coluna “Espaço de troca” por aqui. Na última semana, algumas coisas me chamaram a atenção e eu queria dividir com você. Nesta edição você encontrará comentários de livros, séries, mangás e interiores.
Até Van Gogh tem o coração partido
Eu estava curiosa para ler Van Gogh has a broken heart, especialmente por conta do título, e ver as perspectivas do autor Russ Ramsey em relação à arte mais uma vez. Neste, duas frases falam mais alto: “Reconhecemos as pessoas pelas suas dores” - “Minha professora de arte nos ensinou a amar arte amando arte diante de nós” - Segundo ele, ela lhe deu um conselho que ele carrega com ele até hoje:
“Find an artist you connect with and then pay attention to them for the rest of your life. Read articles and books about them. Go visit them in museums. When you do, they will introduce you to their friends and mentors—the others hanging beside them in the gallery and the artists they mention in the descriptions on the wall beside the paintings, some of whom may be just down the hall themselves. Soon you’ll get to know their colleagues and heroes too. Do this, and you won’t just get to know their art; you’ll get to know them.”
Neste livro ele fala de algumas figuras que ele apresenta no livro anterior.. mas também fala de Norman Rockwell, de Degas - e ao mencioná-lo ele comenta sobre a visão e o que vemos e como nosso olhar é formado por nossas experiências. Ele comenta uma frase proferida por Degas que foi: “Pessoas vêem o que elas querem ver; é falso; e essa falsidade é a base da arte”. Então, o autor comenta como ele gostaria de mostrar a outras pessoas o que ele vê em algumas artes e no mundo e que não seria possível para os outros pois eles não compreenderiam como ele por conta de suas visões diferentes.
Acho que gostei mais deste do que o anterior que li do mesmo autor: Rembrandt Is in the Wind: Learning to Love Art Through the Eyes of Faith.
Regras de composição de ambiente
Encontrei este reels do @CuratigAmbience, da Anne Valois que comenta as regras seguidas pelo Escritório Pierce & Ward, responsável pelos interiores de alguns famosos. O trabalho da dupla Louisa Pierce e Emily Ward é reconhecido pelas atmosferas cheias de conforto e com um toque de criadas de forma espontânea e sem esforço. Eu já havia visto algumas de suas criações mas não tinha visto nada do trabalho delas ainda. Já comentei aqui como sou curiosa pelas regras de composição estabelecidas por alguns escritórios e gosto sempre de conhecer como as pessoas visualizam e criam espaços.
Segundo o Valois, a dupla segue algumas “regras” que resumi e transcrevi abaixo com minhas palavras e adicionei alguns comentários (em itálico), são elas:
1. A regra 80-20 na qual 80% dos itens que compõe o espaço são vintage e apenas 20% são novos. Isso seria o responsável por adicionar personalidade ao espaço - Isto eu acho genial! Sempre comento como são especiais os ambientes que conseguem contemplar peças vintages em seus projetos.
2. Uma paleta de cores inspirada pela natureza, com cores opacas que conferem aos ambientes uma sensação de atemporalidade - uma coisa importante é que elas cores também trazem um toque de calmaria pois são cores que por não serem intensas não vão nos “energizar”
3. Trabalhar as camadas do ambiente de forma a se parecer uma construção feita com o tempo - de todas as regras esta é uma que me chama a atenção, pois eu acho que interiores realmente são uma construção feita com o tempo. Não acho que devemos ocupar todos os espaços de imediato, acho que uma beleza da casa é justamente a vida que ela tem e que ela ganha. É poder mover peças de um ambiente para o outro, comprar coisas diferentes para um espaço que está “à espera de algo”.
4. Consideram o banheiro e a cozinha como uma sala de estar, introduzindo assim arte, luminárias de mesa ou de teto, para fazer parecer que aquele cômodo foi trabalhado - Aqui no Brasil nós fazemos isso mais no lavabo, em relação à banheiros, mas acho que nos dois casos há um aspecto cultural aqui que influencia muito também - nem vou adentrar esta seara - mas o nosso modo de cozinhar, a nossa frequência de banhos e a tropicalidade em si influenciam em nossas questões projetuais de áreas molhadas.
5. Recobrir as paredes com arte ou papel de parede - transformando assim as paredes num ponto focal do ambiente
6. Personalizar o espaço é mais importante do que deixar um espaço perfeito. Sendo assim, o foco é o morador a partir de peças que contam sua história, como trabalhos de escola dos filhos, peças herdadas.. achados. - Não há uma ambientação falsa com produtos de loja, as peças de fato compõem a vida de quem habita o espaço. - Esta eu nem preciso comentar, acho que já diz tudo.
7. Atenção aos detalhes - mesmo que um item não seja notado, ele vai ser pensado. E aqui entra um detalhe que eu adorei: até os fios são encapados para fazerem parte do projeto e compor o ambiente de forma a mostrar como tudo ali é pensado nos mínimos detalhes - literalmente.
Este reel me gerou tamanha curiosidade pelo processo criativo delas que eu resolvi pesquisar mais. Vi que elas têm um livro publicado acerca de seu processo criativo que resulta em espaços maximalistas e com MUITA personalidade, o A Tale of Interiors, publicado pela Rizzoli, minha editora preferida de Coffee table books. Eu também encontrei um artigo no qual elas comentam suas decisões, escolhas e partidos. Você pode ler o artigo - em inglês - clicando no título dele aqui: Louisa Pierce & Emily Ward’s Instinctual and Collaborative Interior Design Process.
“One of our favorite mottos is ‘You never know until you try it!'”
Louisa Pierce
Bibliotecas
Um reel de Valois que eu amei foi este abaixo! Você provavelmente já conhece minha relação com livros e bibliotecas. Neste reel ela é muito delicada ao mostrar a importância da madeira e da iluminação em bibliotecas.
Eu sempre menciono aqui que os projetos que apresento aqui pode ter muito contraste, mas também sempre têm muita madeira. A madeira tem essa característica de trazer aconchego para o espaço, mesmo quando o projeto tem linhas retas e não tem excesso. Prova disso são inúmeros projetos no Japão e na Escandinávia que mesmo com suas linhas ortogonais e ausência de ornamentos conseguem apresentar atmosferas aconchegantes.
Indicação de leitura
Este artigo do NYT sobre como evitar compras por impulso - sempre bom lembrar
SILO
Eu não queria ver esta série. O título não estava nada atrativo pra mim, eu não entendi a foto de capa, e a única coisa que eu pensava era num silo de milho imenso. Eis que entre terminar uma série e desligar a televisão, esta começou a passar, eu me peguei vendo o primeiro episódio e quando terminei já estava vidrada nos cenários que parecem ser um mix de brutalismo e futurismo dos anos 70, com videogames em redomas como se fossem obras de arte e a eterna dúvida: como é o exterior do silo?
Sem spoilers por aqui, mas eu gostaria de recomendar a série que talvez nem seja novidade pra você, mas foi uma grande surpresa pra mim. Acho que é pura antropologia. Ela mostra como a história oral é importante - a transmissão de conhecimento por meio da fala - e como conhecimento é poder onde quer que seja. Realmente “tudo é cultura” como já diria Michel Alcoforado. Devo lembrar também que curiosidade é uma característica determinante em algumas situações. Que mesmo num futuro distópico a decoração tem um papel importante - essa coisa de ter objetos e formas que trazem prazer e alegria em casa (poderia falar muito sobre vários objetos que notei no cenário). E que um povo sem memória tem problemas.
Além disso, devo mencionar aqui que meu cenário preferido em SILO foi justamente uma biblioteca - mas vou me conter em dizer apenas isso para não estragar nada para quem ainda não viu a série.
Vinhos e sentidos
Drops of God (disponível na Apple TV) - uma série baseada em uma mangá, me surpreendeu! Um enólogo morre e deixa uma condição em seu testamento: uma competição deve acontecer entre seu protegido e sua filha, quem reconhecer os vinhos com maior precisão herdará sua fortuna.
O que mais me encantou é como a mocinha usa dos olfato para reconhecer os vinhos. Eu, que não conseguiria reconhecer a diferença de aroma de uma raiz de aipo ou samambaia, fiquei encantada! As cenas da moça, na condição de menina, revisitando aromas como se estivesse em uma biblioteca em sua memória são belíssimas. Além do mais, ela toca num assunto muito sensível: trauma. Estou vendo aos poucos e me delicio com cada episódio. Outra coisa que me encantou também é como a série tem cenários tão distintos - Japão e França. Ah, ela é multilíngue ou seja, são 3 idiomas (Japonês, francês e inglês), as vezes 4 (uma ou outra frase em italiano), os falados na série.
Já vi que tem enólogos comentando a série no Youtube, assim como alguns médicos comentam as séries médicas (e eu dou meus palpites em séries também) mas dessa vez eu vou ver tudo antes de começar a ver os comentários. Uma coisa que eu achei interessante, e que um enólogo comentou no que eu vi de um destes vídeos, é que os mangás além de contarem uma narrativa, também educavam o público acerca do tema. Fiquei curiosa! Mas já entrego aqui: a história da série me pareceu mais interessante do que o que ele contou em relação à história original.
Este episódio do Critics at large sobre séries médicas me chamou a atenção. E por falar em médicos, este aqui sobre saúde mental no Brasil também - fique impactada.
O que salvei recentemente no Pinterest:
uma cadeira em diferentes composições, espaços de mentes criativas, Home office real - ou seja, com livros e papéis por aí (pelo menos dos criativos, escritores e criadores tem livros por todos os lados) e tantas outras coisas que sempre chamam a minha atenção por aí...
Por hoje é isso.
Em breve, os assinantes pagantes receberão a edição Curadoria de Março. Tem algumas edições programadas para este mês. Aguarde!
Até logo!