Lendo espaços
Tim Brown, em Design Thinking, comenta que quanto mais soubermos das pessoas no âmbito cultural, melhor a nossa chance de criar produtos e serviços adequados para cada grupo, ou que atendam mais pessoas. Isto é muito interessante pois, em arquitetura e interiores - mais especificamente em staging, quando aplicamos estratégias de marketing para ampliar o mercado consumidor de um imóvel, temos que descaracterizar o imóvel e, especialmente, tirar elementos que posam ferir culturalmente outras pessoas - e este impacto, por si só, é capaz de reduzir o público consumidor daquele espaço. Isso vai desde símbolos religiosos, utilização de cores à peças de arte que possam ter alguma origem ou impacto cultural em algum visitante em potencial.
Eu sempre fui adepta da “inteligência cultural”, que nada mais é do que estudar a cultura da pessoa/país que vamos conhecer ou visitar. Isso faz com que sejamos capazes de evitar gafes ou constranger pessoas (e a nós mesmos, claro). Você não quer acidentalmente chamar um indiano para um churrasco ou ter como item de decoração algo que é sagrado para outra pessoa mas não para você.
Acontece que atualmente, eu vejo que poucas pessoas tem o interesse em conhecer a cultura do outro. E, recentemente, tive contato com algumas até mudam de país sem ter conhecimento da língua e dos costumes do país. Embora a tecnologia possa minimizar o impacto linguístico, vejo que culturalmente ainda há coisas que não devem ser feitas, mas que são ignoradas e isso me entristece.
Eu adoro a expressão em inglês “read the room”. Apesar dela significar ler pessoas ou a atmosfera/ambiente de um público, eu gosto da ideia de sua tradução literal “ler a sala”, já que podemos ler espaços como forma de reconhecer informações sobre pessoas.
Recentemente, uma amiga dos tempos de intercâmbio mudou de casa e postou no seu Instagram poeminha com uma lista de pequenos rituais que estava seguindo para fazer na casa nova. A lista incluía pendurar um bouquet de temperos na janela, colocar espada de São Jorge na entrada, quebrar um copo e fazer um prato específico na cozinha - nada no sentido religioso, mas seguindo pequenos passos que faziam sentido para ela. Outra conhecida, que também se mudou recentemente, postou que assim que mudou fez uma consagração da casa ao Senhor, seguindo os preceitos de sua religião. Cada uma com sua religião, ritos e preceitos nos quais acredita.
Em nossas vestimentas carregamos símbolos conosco o tempo tempo. Alguns ligados à religião, eu como católica, por exemplo, costumo usar escapulário, medalhas de Nossa Senhora, São Bento ou Santa Teresinha.. Lembro de uma professora que usava a letra hebraica Chet mesmo não sendo judia em homenagem ao marido, que era judeu. Uma amiga evangélica usa uma cruz. Hindus e Budistas, por exemplo, usam japamalas. Uma outra amiga de intercâmbio usava um colar de um casal dançando tipo este. Ele me chamava a atenção e não por seu tamanho, que era até um pouco grande, mas porque eu queria entender o que ele simbolizava para ela. Um dia, ela explicou a origem de sua família materna e paterna, como a tradição era passada/herdada. Os papéis familiares herdados pelo pai e pela mãe, e assim por diante. E, sem que eu perguntasse, ela me explicou que aquela joia era um registro de sua ascendência, os circassianos. Ainda hoje sinto que naquele dia tive uma verdadeira aula de cultura.
Uma outra amiga, que fiz recentemente, é aficcionada por simbologia. Ela comentou esses dias como ela lê os espaços que costuma frequentar baseado em seus estudos. Apesar de não ser arquiteta, sua leitura de espaços é bem interessante pois faz uso dos símbolos para compreender as escolhas de cada um que habita ali. Reforçamos em nossos espaços nossas crenças, assim como fazemos como a moda.
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