O Tempo e os arquitetos

Muitas pessoas expõem no instagram que “se você não mostrar o que você faz, ninguém vai saber qual é o seu trabalho”, enquanto isso, advogados urgem para que os arquitetos leiam e revejam com atenção as cláusulas de seus contratos sobre a exposição de imagens das casas de clientes. Nesse meio de “expor ou não expor - eis a questão?”, eu sempre relembro de uma professora que dizia que desenho era algo muito íntimo; uma linguagem na qual expomos de forma muito clara o que há dentro de nós.

Ultimamente passei a acreditar que mais do que nunca, a relação do cliente com o profissional arquiteto também é muito íntima. Afinal, ao arquiteto o cliente desnuda seu eu em busca da concretização de um sonho. Expõe os valores financeiros que vai disponibilizar para a transformação que busca fazer em seu espaço. Aprende a falar não ou a dizer que precisa de uma pausa para conseguir reestabelecer o projeto/obra. Aprende a pedir tempo para escolher, resolver, absolver tudo que está acontecendo.

E nisso, eu vejo o tempo como um elemento importante. Meu objetivo hoje é falar sobre o tempo. Não no sentido físico-matemático da quarta dimensão ou da relação espaço-tempo. Mas no sentido do tempo do cotidiano mesmo, aquele que quando a gente percebe, passou. Não apenas para o cliente que escolhe, mas eu também vejo o tempo como uma ferramenta importante para os criativos, especialmente os arquitetos. Eu não julgo o cliente que demora pois está escolhendo com atenção dentre as opções de cadeira ou o tecido do sofá, afinal, é ele quem vai habitar aquele lugar, não eu. É ele quem tem que ter certeza de suas escolhas. Agora, ao mesmo tempo, eu acho incrível o que o tempo faz pelo arquiteto: ele dá experiências, ele amplia o repertório, refina o olhar. Você já imaginou quanto tempo um arquiteto investe ao se dedicar em conhecer infinitas particularidades de diferentes mundos?

Em termos de conhecimento - para fazer um projeto (seja uma construção ou até mesmo uma decoração), por exemplo, o tempo investido pode ser enorme, se não houver alguma referência. Se o arquiteto é comissionado a fazer um quarto infantil, pode se deparar com perguntas do tipo: é montessoriano ou Steiner (Waldorf/antroposofia)? Se vai fazer uma escola: qual a metodologia de ensino? É aprendizagem colaborativa ou Ensino tradicional? Se for aprendizado infantil: Construtivista, Freiriana, Montessoriana, Tradicional ou Waldorf?

Ah, e restaurantes variam de acordo com a cozinha, há os mais diversos tipos de culinárias e suas influências culturais. Se for uma residência para uma família chinesa, deve pesquisar Feng Shui, se for para uma família indiana, Vastu Shastra. Se for construir no hemisfério norte tem a mudança de sistema métrico e a relação diferenciada do sol e os pontos cardeais. Se for participar de concurso então… um mundo a parte.

A exposição internacional do Japão em 2023 tem um tema interessante:  “Designing Future Society for Our Lives”, cujos subtemas são: “Saving Lives”, “Empowering Lives” e “Connecting Lives”. A tradução de mundos em espaços requer tempo de pesquisa, mas, ao mesmo tempo, “tempo de experiência” - fazendo aqui o uso das palavras de Olgária Mattos. Por isso muitos brincam que o ápice da carreira do arquiteto é a partir dos 40, quando ele já se conhece, já amadureceu e experienciou muita coisa. Precisamos entender tudo isso.

É difícil transformar em espaço aquilo que não conhecemos.
Mas também é preciso investir muito tempo na construção da teoria por trás destes espaços.

Quando adentrar um espaço pense nas experiências que o arquiteto deve ter tido e que podem estar ali contemplada. Pense que para que exista um traço no papel, há muita teoria por trás, livros, ensinamentos, viagens e amadurecimento. Sonhos realizados e sonhos que foram deixados para trás podem ser vistos como cheios que coexistem em harmonia. Afinal, nem todo vazio deve ser ocupado, ele pode contemplado como parte de um projeto.