And just like that: Staging
O porquê de precisarmos despersonalizar nossos espaços
AVISO: este texto contém spoilers do episódio 1x04 de And Just Like That
Toda quinta-feira, assim que acordo, corro para cozinha para fazer um bom latte e depois sendo no sofá para ver And Just Like That. No episódio de hoje vemos uma situação muito interessante e que fez escrever assim que o episódio acabou. Acontece que para colocar sue apartamento no mercado, a corretora de imóveis de Carrie sugere que “all must go” ou seja, “tudo tem de ir embora”. O apartamento de Carrie reflete absurdamente sua personalidade. Um mix de patterns e devo dizer bold patterns, como o apartamento de uma fashionista deve ser. Há cores fortes, embora não vibrantes, e em tudo percebe-se que há uma escolha personalizada feita sob medida.
Para contrapor esse apartamento, vemos que seu antigo apartamento de solteira parece não ter sido mudado, como no filme, trazendo de volta a cadeira em estilo colonial, as três prateleiras, o telefone antigo… só faltou a cadeira do Aidan, mas aí seria estranho demais, certo?! Não precisamos deste tipo de reminder na décor dela. Talvez tenha sido a forma do set designer nos contar que aquele assunto foi encerrado e superado.
Bom, esse contraponto entre o antigo apartamento de solteira - “antigo e um pouco despersonalizado, quase que em construção” - para o qual ela está retornando e o apartamento de casada - super decorado e personalizado - querem nos contar algo. Talvez ainda exista espaço para uma mudança ali, talvez ele reflit Aa como a Carrie esteja se sentido, de volta àquela situação, como era antes dela casar. Aliás, se você quiser, você pode alugar um apartamento inspirado no apartamento de Carrie no Airbnb.



Seema, a corretora de imóveis transforma o espaço do apartamento de Carrie e Big num espaço completamente bege e despersonalizado, sem vida, no qual até os livros tem a lombada ocultada para que não haja interferência de cor. O porquê dela fazer isso, já falamos a respeito disso aqui, é porquê quanto mais despersonalizado o espaço, mais chances de outras pessoas se imaginarem ali. É muito mais fácil criar a partir do “espaço em branco”, do que você se imaginar num espaço que tem a cara de outra pessoa. Por isso até “ela” esconde a lombada dos livros; é uma forma de ocultar o gosto daquela pessoa e, sejamos sinceros, livros revelam muito mais sobre nós do que nós podemos imaginar.


Deixo aqui um link com uma entrevista com a equipe de design da “And Just Like That”: Apartment Therapy Set Design Interview: The Design Team of “And Just Like That…” Shares How Carrie’s Apartment Continues to Be the Dreamiest Space
Deixo aqui uma dica: Não precisa ficar tudo bege e sem graça como fica o apartamento da Carrie1 - achei até bem exagerado (aliás, eu AMO o foyer todo em marrom com uma obra de arte em destaque, tal como apareceu no terceiro episódio). Se você quiser despersonalizar um espaço você pode sim usar uma cartela de bege, ou diferentes tons, mas use um contraste ali para que fique mais atraente. Branco e preto, assim como creme e azul-marinho são outras ótimas opções de cores que podem ser usadas. E use obras de arte que não são tão personalizadas, por exemplo: fotografias de paisagens, veleiros… Sabe aquela máxima: “Quando não souber o que vestir, vista-se como se fosse velejar?” - Ela cabe perfeitamente aqui. Quando não souber como decorar, pense como se fosse velejar. O que isso te remete? Tons de azul, bege, branco; Calmaria; brisa, vento no rosto; cheirinho de água salgada. Pense em como esses elementos podem ser convertidos em decoração. É um exercício simples e que funciona muito! Eu AMO trabalhar com staging porque ele nos permite repensar os básicos com charme; criando atmosferas e propiciando vislumbres de sonhos futuros.
Agora, sabe o que eu mais AMEI neste episódio? A chance de vermos o apartamento da LWT, a amiga de Charlotte, e sua coleção de arte. Melhor ainda: Sabermos que Charlotte não abandonou a arte por completo, que ela está no board do The Met e vê-la falando sobre a coleção da amiga como um investimento (amanhã vai sair um post ótimo sobre mercado de arte; stay tuned).
A meu ver o apartamento personalizado de Lisa, todo branquinho no qual as obras de arte se destacam é lindíssimo; tal como um cubo branco2. E acho que foi um ótimo contraponto neste episódio pois temos a chance de ver um apartamento com uma paleta de cores neutra mas com muita personalidade.
Existe uma regra que alguns interior designers usam para cor: 60 | 30 | 10 + Preto e Branco nos detalhes. Essas porcentagens estão divididas respectivamente em 3 partes: Paredes, piso e móveis grandes (60) | Paredes de destaque, tecidos (cortinas e tapetes) e móveis menores (30) | Arte e fotos, almofadas e acessórios (10) + preto e branco para acessórios.
Veja como neste caso, sem cores, o branco assume o papel principal e o preto como o contraste, acho que nosso olhar observa mais os detalhes quando não são atraídos pelas cores3.
Como eu disse, uma cartela neutra não significa um espaço despersonalizado. Acho legal destacarmos como o hall de entrada de Lisa tem uma personalidade. Perceba que aqui o “bold” que conta com estampa do papel + fotografia + acessórios. Cria-se então um espaço de personalidade capaz de criar um efeito surpresa pra quem adentra.
Quis fazer este post para explicar o staging que acontece no apartamento de Carrie e também para comentar que um apartamento branco ou bege não precisa ser dull (sem graça) e pode sim ter muita personalização, charme e beleza.
Nos vemos em breve!
Um apartamento tem muitos fatores que influenciam em sua venda, como localização, estrutura predial… Um apartamento como esse, localizado na 5a avenida, como aponta este podcast, teoricamente “se venderia sozinho”. No entanto, o fato em si contribuiu para a construção de uma narrativa. Como reforça o review: a relação do bege com a Natasha… enfim, achei válido comentar a situação do staging pois são poucas as vezes que temos essa oportunidade. Plus: pouco se comenta no Brasil e, realmente, faz muita diferença.
Cubo branco é uma forma de expografia no qual o espaço de exposição é totalmente branco para receber a obra de arte e, assim, ela se destacar e receber toda a atenção para si. Por acaso, encontrei esta aula sobre Expografia do Cubo Branco – o Caso Masp (SP) no YouTube do Itaú Cultural e que faz parte do curso sobre cenografia e expografia brasileiras,.
Um detalhe extra: Segundo o review do episódio no podcast Every Outfit, este apartamento é o apartamento da ex-esposa de Kendall Roy, como mostrado no episódio 3x02 de Succession. Vejamos o que o set design é capaz de fazer.