Quantos assuntos cabem em uma newsletter?
Podcasts, pessoas interessantes, histórias e cartas de apresentação.

As vezes me pego pensando em quantos assuntos podem ser contemplados em uma newsletter, especialmente quando falamos sobre arquitetura e urbanismo. Afinal, existem muitos temas a serem trabalhados “da colher à cidade”, como dizia Gropius. São infinitas (dentro de um universo finito?!) as atribuições dos arquitetos. Mas, ao longo da vida, descobri que nem todo arquiteto é como eu: curioso, viajante ou até mesmo sonhador. Se avaliarmos, vemos que existem os que são mais técnicos, os funcionais, os teóricos e por aí vai.
Acredito que por sabermos um pouquinho de cada coisa, a maioria de nós pode ser sim considerada interessante. Minha ideia era fazer uma newsletter com este tema: pessoas interessantes. Eu queria começar falando sobre personalidades e até refiz o meu MBTI (o teste Meyer-Briggs, aquele das 4 letrinhas, também conhecido como “o horóscopo corporativo”, sabe?) para comentar com certeza sobre alguns tópicos. Eu sou INTJ, igual a Michelle Obama - óbvio que não deixaria de comentar isso. Em todas as 4 vezes que eu fiz o teste, sempre deu este resultado, o que me mostra que eu sou constante. Eu reconheço muito da minha personalidade: o amor pelos livros, o fato de precisar ficar sozinha pra recarregar a energia, o viajar sozinha para apreender mais a experiência, o fato de ser uma pessoa extremamente curiosa…
Este ano eu fiz 31 anos. Como me disseram ontem, no parque no qual eu estava, eu sou muito (ênfase no muito) nova. A pessoa comentou ainda o seguinte: “se você quiser recomeçar a vida do zero, ainda seria cedo”. Sabe, eu tenho refletido cada vez mais sobre a vida em si. Palavras como riqueza, sucesso e amizade têm ganhado novos significados.
Desde que comecei a estudar “Comunicação não violenta”, eu tenho feito alguns exercícios na vida, tais quais: não julgar, nomear sentimento e etc. E o exercício de não julgar tem sido uma constante, é um aprendizado contínuo. A todo momento me pego falando: “ninguém é nada”. Parece fácil, mas não é. Especialmente quando eu lido com algo tão abstrato como parte do meu trabalho: a estética - o que é bonito para um pode não ser bonito para o outro.
Entretanto, nos últimos tempos, o que eu tenho feito é pensar em coisas interessantes. Parece-me que quando falamos em coisas interessantes, temos mais chances de termos uma variedade de assuntos que agradem mais as pessoas. Uma vez eu estava em um happy hour com várias outras arquitetas que discutiam detalhamento de telhado. Em um impulso, eu falei: “Gente, é happy hour, o trabalho já acabou. Vamos falar de outro assunto que não trabalho? O que vocês tem lido?” - fez-se então um silêncio na mesa. “O que vocês têm visto? Foram à alguma exposição recentemente? Viajaram? Teatro?” - alguns segundos depois e o assunto mudou e foi bem melhor porque as pessoas começaram a compartilhar o que consideravam interessante.
Nas últimas semanas eu ouvi três podcasts que me motivaram a querer falar sobre trabalho e pessoas interessantes. Vou começar pelo último que ouvi, por indicação de um colega, o episódio do É Noia Minha - Trabalhar de casa ou morar no trabalho? (Ouça o episódio aqui). Nele, um dos convidados comentou sobre a relação do brasileiro com o trabalho, como se o trabalho determinasse a pessoa, sendo uma parte vital de sua vida. Isso faz com eu me lembre desta cena de Comer Rezar Amar, quando eles estão escolhendo palavras para as cidades e depois Liz Gilbert tenta definir sua palavra e ela só consegue pensar em escritora, ou seja, ela tenta se definir pelo que ela faz.
Apesar de terem sido gravados com meses de distância, outros dois episódios que ouvi convergiram para o tema da “pessoa interessante”, e aqui eu comento: eu acho que quando uma pessoa é, por natureza, uma pessoa interessante, ela muda a sua relação com o trabalho. O trabalho para a ser um lugar no qual ela pode expressar toda sua vivência. É como se o trabalho passasse a ser um meio de expôr a suas experiências e vivências. Parece confuso? Explico: a meu ver, a pessoa interessante, ela não é determinada pelo trabalho, mas pelas coisas que faz fora dele.
O episódio do podcast “More than one thing” (ouça-o aqui) da designer Athena Calderone, no qual ela apresenta Sebastian Brauer começa com uma apresentação “cheia de hífens” da designer (Athena se apresenta como designer, chef, criadora de receitas e tantas outras coisas), numa tentativa de mostrar quantas coisas compõem a pessoa que somos: um conjunto de experiências. E isso é o que nos torna únicos! Isso é o que torna interessantes: a forma como lidamos com os outros, as experiências que tivemos, as coisas que construímos… O próprio convidado, Sebastian, comenta que mandou uma carta de apresentação para um trabalho uma vez dizendo algo mais ou menos assim: “eu tenho uma bagagem que faz com que eu seja uma pessoa interessante e capaz de cooperar com vocês, a ponto de criar novas coisas. É dessa forma que eu posso contribuir”.
Em outro podcast, a influencer Thai de Melo Bufrem também comentou sobre pessoas interessantes, foi no episódio #77 do “De Carona”, podcast da Thaís Roque (clique para ouvir). Segundo ela, é essa autenticidade que carregamos que nos abre portas.
Quando eu achava que este texto estava pronto para ser enviado, li um texto que Maria Cláudia Cassou nos apresentou semana passada, neste post do The Lolla o qual eu recomendo a leitura. Nele, ela trouxe seguinte a reflexão, que leu em um livro: “Na concepção homérica, uma vida que vale a pena ser vivida (aquela que seria próprio do humano) é aquela que vale a pena ser contada; aquela cuja beleza, realizada em gesto, pode e deve ser traduzida na beleza das palavras” (GALLIAN, 2022 apud CASSOU).
Um dos exercícios mais difíceis com os quais eu já me deparei foi escrever um “quem sou eu”, indicado tanto por terapeuta quanto por mentores. Acho que escrever cartas de apresentação com objetivos específicos é muito mais simples do que me apresentar com a simples missão de me apresentar. Ao ler essa provocação que Maria Cláudia apresentou, eu senti que a tarefa poderia ser mais simples, e me lembrei na hora da parte da carta que Sebastian menciona à Athena Calderone.
Ao escrever isso, me lembrei de uma amiga que comentou tempos depois de me conhecer que me julgou secretamente pelo meu estilo e pela forma como eu me visto, e disse que quando me ouviu contar algumas histórias, ela percebeu que eu era uma pessoa muito mais interessante do que ela imaginou. As vezes nós não deixamos transparecer nossa história, ninguém vai adivinhá-la, é preciso contá-la. Por isso eu acredito que a nossa casa conta a nossa história de forma mais fácil do que nós mesmos, pois é um lugar onde conseguimos expor mais fragmentos de uma narrativa em construção.
Uma palavra que carrego comigo, desde quando li Comer Rezar Amar, é “passionnée” (apaixonada, intensa) pois eu sempre tive esse desejo, essa paixão por conhecer as coisas, essa curiosidade que me move e me impulsiona a ir adiante. E, mais após a faculdade, redescobri essa vontade de querer contar histórias, motivo esse inclusive que me levou ao mestrado e ao doutorado. Eu sou uma apaixonada por palavras, por isso acredito que mais do que apenas desenhar, como dizia Lina Bo, o arquiteto também deve escrever. Sempre peço licença para conhecer as pessoas por meio de suas próprias palavras. Acho um exercício maravilhoso.
Mas, e você? Você consegue escolher uma palavra para carregar consigo, ou escrever um “quem sou eu” e contar a sua história com facilidade? Compartilhe comigo!
Até breve.
Eita, amei! Adoro pessoas interessantes. Adoro gente que me surpreende nas conversas com conhecimentos aleatórios que a gente nunca imaginou que a pessoa tinha.
E, sobre as palavras que levamos pra sempre, a minha é connaisseur. Li num livro mega despretensioso de uma americana que falava sobre a relação dos franceses com suas casas, que o connaisseur era um conhecedor de determinado assunto, um especialista, mas não por título, mas porque ele se empenhava genuinamente para saber sobre aquele assunto a ponto de se aprofundar nele. Achei tão legal, gente que estuda assuntos e desenvolve habilidades fora do seu contexto técnico, pelo prazer de dominar aquele assunto, pelo amor ao tema, a prática, ou seja la o que for. <3
Adoro o que você escreve! Penso a mesma coisa: não quero me limitar pelo meu trabalho, apesar de amá-lo, eu sou mais do que isso!
Estou aqui pensando em uma palavra, gostei muito da sua... seguirei na minha reflexão, mas por enquanto posso ficar com a sua? 😬