Após o sucesso da edição da semana passada, resolvi dar continuidade ao tema e não apenas dividir com você o que eu li por aqui no primeiro semestre do ano, como também contar mais sobre formatos de leituras e como/ e o porquê de eu escolher cada um no meu momento atual.
Ao ver o anúncio de Ilaria Gaspari como convidada da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que acontecerá de 9 e 13 de outubro deste ano, resolvi antecipar a leitura de “A vida secreta das emoções”, que estava na minha lista há tempos, no entanto, ao buscar o livro no BibliOn, o mesmo estava com uma fila de espera. Comecei então a ler “Lições de felicidade”, que estava disponível. Ao começar a ler, me deparei com um texto belíssimo e frases que me fizeram suspirar. A forma como o tempo desta leitura se encaixou em minha vida foi incrível! Logo na abertura, a autora comenta o “refúgio provisório das caixas de papelão” - sendo que o tema da newsletter desta semana era “habitar o provisório”, mas foi adiada para semana que vem uma vez que eu senti a necessidade de dar continuidade ao texto de semana passada. Abaixo, uma passagem do livro que me encantou:
“Qualquer um que tenha vivido, uma vez na vida, a experiência inebriante da mudança, sabe: começa-se sempre pelos livros. Aos olhos dos empacotadores, que estão ali prestes a carregar meses, anos, décadas inteiras de vida no refúgio provisório das caixas de papelão, a biblioteca, com as suas enganadoras filas compactas de paralelepípedos regulares, parece uma radiante miragem. Nos raros (mas não impossíveis) casos de bom humor na mudança, a biblioteca é a imagem perfeita, a ilustração concreta daquilo que o inconsciente otimista vai repetindo desde quando decidiu, ou descobriu, que precisava mudar de casa: vai ser fácil. Antes que você perceba estará tudo embalado. Mesmo nos momentos em que prevalecem niilismo, desânimo, preguiça, ansiedade diante das caixas, a biblioteca parecerá uma tábua de salvação: se embalar as outras coisas da casa sugere contorcionismos e desafios à la Tetris, a biblioteca é o exercício fácil, a parte veloz a ser encarada como um aquecimento para as tarefas ingratas que virão em seguida”. - Ilaria Gaspari em “Lições de felicidade”
Desde o ano passado, divido aqui não apenas o meu prazer pela leitura, mas também a luta pelo retorno à constância após um burnout no final do doutorado, em plena pandemia, e o reencontro com a literatura pelo prazer e não apenas como fonte de pesquisa/trabalho. Aliás, o livro “Dá um tempo” de Izabella Camargo é fantástico e foi o que me ajudou a sair deste turbilhão. Eu o li logo após o lançamento e o meu diagnóstico, em Setembro de 2020, e lembro das tardes do final de semana à beira da piscina nas quais passei lendo-o. Este livro também foi marcante pelo seu timing, pois foi como encontrar no livro um abraço, era como ser compreendida, ouvida, acolhida - tudo ao mesmo tempo. Livros têm esse poder!

Adoro a forma como Ilaria menciona que a biblioteca contempla “meses, anos, décadas inteiras de vida”. A minha atualmente contempla os últimos 15 anos da minha vida. Infelizmente, pela falta de espaço, periodicamente eu tenho que fazer “limpas” em casa de tantos volumes que se acumulam (sem contar os meus preferidos da adolescência que estão na casa de minha mãe). Já vendi 35 volumes de uma única vez ao sebo. Constantemente repasso livros à conhecidos, esses dias enviei um para um amigo (se você não conhece o Registro módico, é uma ótima forma - e bem em conta - de enviar livros pelos Correios), dei outro para um vizinho...
Tive de estabelecer um limite por aqui, por conta do espaço e para evitar o adiamento de leituras, tenho uma estante e apenas posso ter a quantidade de livros que ela consegue abrigar (sem contar um outro que eu deixo nos outros cômodos com parte do styling).
No post, Simplifique #5, dividi como organizo a minha estante e no Home Office, comentei acerca de Styling de estantes.
Já comentei aqui que na cidade na qual cresci não tinha livraria. Eu dependia então da biblioteca municipal para pesquisa, da biblioteca da escola para literatura e de uma locadora de livros que tinha no pequeno shopping da cidade que era quase uma galeria. Sim, tinha uma locadora de livros e eu A-MA-VA. Às vezes ia lá só passear e ver as novidades. Lembro até hoje do pequeno espaço em frente à saída do elevador, dos mobiliários em madeira maciça feitos sob medida (do cheiro daquele espaço!) e dos volumes novos e recém-chegados que estavam esperando alguém vir buscá-los. Harry Potter, por exemplo, chegou antes lá do que na biblioteca do colégio. Tanto na biblioteca como na locadora havia filha de espera para pegar os livros mais novos. E eu esperava prontamente a minha vez. Este “tempo de espera” fazia com que a leitura tivesse um gosto diferente; ele a tornava especial - afinal eu esperei por aquele momento.
Em Vambora, quando Adriana Calcanhoto canta: “Entre por essa porta agora (…)/ Você tem meia hora/ Pra mudar a minha vida” eu sempre tenho a sensação que ela está se referindo à um livro. Embora não seja essa a referência, a música foi inspirada em dois livros que estavam na estante de sua casa, como ela conta aqui.
Aos 12 anos, ainda sem livrarias na cidade, descobri uma coisa maravilhosa ao visitar a livraria da cidade vizinha, que logo fechou: a compra online! A partir de então comecei a comprar na Saraiva, na Siciliano e na Livraria Cultura. Só que por conta da demora e do frete, as compras passaram de 1 para 2, 3 e até mesmo 4 livros! (O que dizer das atuais promoções da Amazon então?!) Eu não precisava mais esperar para alugar ou pegar o livro emprestado, apenas esperava os 7 dias que demorava para o correio fazer a entrega. Aí já não era mais tão especial, era mais uma ansiedade pela espera, a ponto de me fazer conhecer os carteiros da cidade e seus intinerários e esperar por eles na portaria. Um deles, um senhor muito simpático, já me avisava: “O seu vem mais tarde, de carro. Pode esperar!” - e ele me ensinou a contar os dias para acertar direitinho quando ia chegar. (Era um tempo no qual as notas fiscais ainda eram de papel e impressas naquelas impressoras matriciais, lembra disso?).
Por volta dos 15 anos, eu já tinha me desconectado um pouco deste tempo de esperas e não dependia do sebo do senhor sul africano na cidade vizinha (já comentei dele aqui), afinal, tudo ficou mais simples, em compensação ficou mais difícil equilibrar leituras da escola com as leituras por prazer. Nessa época, soube que Saraiva importava livros e descobrir aquilo foi incrível . Livro fora de circulação? No Estante Virtual tem! Na faculdade, cheguei a comprar edições de livrarias independentes da Austrália, de Hong Kong e de um sebo da Suécia pelo e-bay. Livro de fora? A Livraria Cultura encomendava, o Book depository entregava com frete grátis e sem taxas… depois veio a Amazon… e o resto é história. Com o Kindle - compramos com um clique! A adolescente que eu fui, que contava os dias úteis para receber seus livros, nunca imaginou poder ter um livro apenas com um clique.
Quando me mudei para Cambridge-MA, em 2018, fui apresentada à um novo formato de livrarias públicas. Não bastava ter acesso à biblioteca de Harvard (onde aliás não havia limite de livros e era possível ficar com eles o semestre todo - um sonho!) e do MIT (que não permitia o uso de post-is nos livros), eu gostava de estudar na biblioteca pública de Cambridge, um edifício histórico com um teto cujos detalhes eu me recordo até hoje. Era um ambiente diferente de tudo. Lá conheci os apps que a biblioteca disponibilizava para consumo: Libby, Kanopy (tipo um Mubi) e o Hoopla - e como era legal poder pegar audiolivros, ver filmes cult e ler todas as revistas diretamente no celular.
Foi logo nessa época que comecei a ouvir mais audiolivros e me reencontrei com o “tempo de espera” da fila da biblioteca, afinal, havia livros disputadíssimos ali, e tinha fila até no aplicativo. O pior era perder a vez, pois quando não abria o app na hora, minha vez passava para outra pessoa e eu ia para o final da fila e tinha que esperar de novo. Essa coisa do audiolivro e do e-book acaba sendo prática pela questão da portabilidade; não pesa e eu posso levar minha biblioteca comigo para onde eu for... mas acabo perdendo a questão de ver espacializadas as épocas da vida e de encontrar pequenas surpresas dentro de cada volume. Agora mesmo, para escrever esta edição, recuperei na estante um livro que li na época da faculdade e, dentro dele, tinha um rascunho de um trabalho de desenho do objeto - um expositor de revistas.
No domingo, saí para caminhar e, por acaso, acabei encontrando um conhecido. Nós nos conhecemos na livraria e, como sempre, trocamos figurinhas acerca de nossas leituras atuais. Uma coisa que comentamos foi acerca das pilhas de livros não lidos que se acumulam pela casa e a lista de livros a ler - até mencionei aquele meme no qual a pilha de livros ultrapassa os edifícios altíssimos.
Para rir: 50 Memes para quem ama livros e mais aqui.
Tem uma frase do
que é assim: “Eu sei que compro muitos livros mas eu gosto de pensar que enfileirá-los nas paredes da minha casa com eles afasta o mal de uma forma profunda e importante” Há quem diga que bibliotecas também funcionam como isolamento térmico. Apesar do Feng Shui dizer o contrário, que não deveríamos ter tanto papel em casa, especificamente no quarto. Brincadeiras à parte, eu sinto que sempre quando eu compro exageradamente, os livros que esperam por mim, e isso que eu tenho tentado evitar nos últimos tempos.Este conhecido fez o seguinte comentário: “Consumismo é consumismo - seja para livros ou para blusinhas” e mencionou que estava reduzindo e muito a compra de livros haja vista os volumes que se acumulavam em sua casa. Eu já comentei neste post que não me considero consumista, embora consumisse muitos livros. Eu então comentei com este conhecido o meu projeto de leitura deste ano e como o fato de priorizar as leituras que já tenho e ainda não tinha lido, estava fazendo com que eu reduzisse e muito a minha pilha de livros a ler em casa e a compra de livros. Até agora foram 4 livros comprados este ano - 2 no sebo (edições esgotadas e importadas - um verdadeiro achado!), 1 importado que foi um achado em uma livraria independente no interior de Minas, que encontrei via Amazon) e 1 na livraria do bairro. Acho importante mostrar isso para evidenciar que embora eu assine o serviço de audiolivros da Amazon, minhas compras de livro físicos são, em sua maioria, de pequenos livreiros, o que é muito importante no cenário atual.
Comentei com ele também como usar o Audible (e sua assinatura) e o BibliOn, ajudava a minimizar um pouco estas pilhas e me permitia investir em livros mais diferentes e até difíceis de achar, como as da editora Rizzoli, por exemplo - que acabam sendo um investimento mais alto. Eu valorizo o livro, sua construção e sua beleza. Eu sou apaixonada por livros físicos, e já até comentei aqui sobre o trabalho de designers que se dedicam na construção de livros belíssimos.
Um parênteses: Você que casas de leilão tem uma seção dedicadas à livros? Pois bem. Deixo aqui um link da seção de livros tradicional casa de leilão Christie’s para você explorar, se quiser. Também vale ficar atento aos posts feitos nas redes, como este.
Já comentamos por aqui, neste post mais especificamente, que ler em papel é melhor.. mas, neste ano, não tenho lido tanto em papel… Tenho aproveitado para “zerar” essas listas de espera no Kindle e na estante. Sabe o que eu não gosto nos e-books? Eles formam uma pilha invisível. Por não ser um material físico, esta pilha se forma no dispositivo… então aquele acúmulo não é visível… por isso, eu sempre evito comprar livros digitais se não puder ler naquele momento - e também por isso gosto da biblioteca digital - empresto, tenho um prazo a obedecer - o que também é um estímulo para a leitura - leio e devolvo (e também porque eu prezo pela existência deste tipo de serviço e quero que ele continue existindo).
Esta busca pela retomada do prazer da leitura é constante. Acho que não existe fórmula correta. Há dias nos quais eu escrevo o dia todo e eu já senti que quando isso acontece, tudo o que eu mais quero ao final do dia é ver um seriado (de preferência Gilmore Girls) ou filme e não pensar em nada. Escrever é um prazer, mas também consome energia, especialmente se for a produção de uma aula ou a produção de artigos acadêmicos. O olhar atento e a busca por inúmeras referências são capazes de me cansar. Sabe aquele cansaço mental? Pois bem.. e um olhar cansado não lê com a mesma atenção, e eu tenho prazer em priorizar a leitura; o conhecimento - como contei no texto “O tempo e os arquitetos”. Sendo assim, encontrei nos audiolivros uma companhia feliz para dias nos quais a vista está mais cansada, e eles têm sido preteridos com uma certa constância por aqui dados os movimentos atuais da vida.
Nesta semana, dividi em um post os 34 livros que li até agora (link abaixo) identificado sua versão (e-book, audiobook ou físico) e se foi emprestado ou não. Aliás, me sinto completamente despida ao compartilhar tudo que eu li, mas acho que mostrei que realmente leio de tudo - de livros leves à estudos antropológicos, mas ao reler o post, percebi que que poderia ter lido coisas mais interessantes - mas esta é a minha autocobrança falando. Acho que li o que deu, o que eu quis, e o que tinha à minha disposição e tudo bem… a vida é sobre busca o equilíbrio não é mesmo?
Adorei viajar no tempo para sua cidadezinha sem livraria e acompanhar as mudanças da modernização.
Acho chique pessoas que leram todos os livros da estante. Se bem que, acho que não conheço ninguém assim.
Pra mim um lado negativo de acumular muitos livros não lidos é a dificuldade de resgatar a empolgação, que estava lá quando o livro foi adquirido e se perdeu com o passar do tempo e outros livros que pularam a fila.
Eu compro livros sempre e mesmo não dando conta de ler todos, me sinto preenchida com eles por perto🧡