#12 - México
México de Fridas, Ricardo e Barragan... mas qual é o seu México?

Olá!
Hoje vamos falar sobre o México. Sabe, este é um país que eu não tinha muito interesse em conhecer, ao contrário do Japão que eu comentei semana passada. O México foi despertar meu interesse na pós-graduação e eu acho que a explicação para isso é simples: cada um tem um imaginário acerca de um lugar, e nós construímos este imaginário de acordo com as nossas referências e a maturidade tem muito a ver com isso. Criamos esse desejo patente de conhecer um lugar de acordo com o nosso conhecimento acerca dele.
Vou dar um exemplo: para uma amiga historiadora, o México é o México de sítios arqueológicos, de museus, de Teotihuacan.. e aí vai. Para as mulheres da minha família, católica, o México delas é povoado por Guadalupe e Juan Diego, a padroeira da América Latina. Para meu amigo norte-americano, não há melhor cidade no mundo do que a Ciudad de México. Para uma amiga psicóloga, é o lar de Frida e Diego, para um amigo literato e para uma amiga designer é onde fica Mérida, um destino colorido e artesanal. Para uma influencer, além de destino arquitetônico e artsy, era um lugar onde encontrar refúgio em Todos os Santos. Veja, cada um tem um México.
Ainda não conheço o México, mas, no meu imaginário, é um destino repleto de arquiteturas coloridas, de murais, de estampas, um destino repleto de vida, com Fridas, Ricardo, Luís e tantos outros. Por isso, quis hoje falar brevemente sobre o que me inspira a conhecer esse destino que me exigiu tanta maturidade e conhecimento a fim de que eu me apaixonasse por ele.
México de Fridas
Eu tive a chance de ver “Frida Kahlo and Arte Popular” no MFA em Boston, em 2019. Frida Khalo é uma artista intrínseca ao imaginário mexicano. Eu ainda não fui ao México, mas já fiz um tour virtual pela “casa azul” da artista, hoje Museo Frida Khalo, onde ela passou grande parte da vida, desde a infância, até o casamento com o muralista Diego Rivera. Só que esta Frida, a gente já conhece, hoje eu quero falar sobre uma Frida contemporânea, também considerada artista, uma arquiteta, que tem ganhado espaço e que eu muito admiro o trabalho: Frida Escobedo.
Já falamos muito dela aqui! Falamos sobre seu pavilhão para o Serpentine Gallery - na Newsletter #7, de suas lojas para a Aesop na Newsletter #10 e neste post, e agora vamos falar de “La Tallera”. Eu gosto de explorar diferentes trabalhos do mesmo arquiteto para mostrar sua pluralidade como profissional, acho fundamental! É importante conhecermos uma pessoa pelo conjunto de sua obra.
“La Tallera” é um atelier convertido em museu - ou galeria pública de arte, que conferiu à arquiteta o prêmio AR Emerging Architecture 2016 devido à um “simples gesto” foi capaz de transformar o local. O local era o atelier do muralista David Alfaro Siqueiros, na cidade de Cuernavaca, no México. O gesto de Frida? Rotacionar os murais, que ela descreve da seguinte forma:
“Rotacionar os murais aciona os elementos simbólicos da sintaxe arquitetônica da fachada, alterando a relação típica entre galeria e visitante” Frida Escobedo para Dezeen.
Neste link há uma documentação fotográfica de seu pensamento para o projeto que conta, inclusive, com um estudo geométrico que ela fez sobre fotografias da Casa de Vidro de Lina Bo, vejamos aqui sua referências (!!!). Assim nos é então revelado o rico processo teórico por trás de sua intervenção. Entendemos então como é preciso muito trabalho para um “simples gesto”? Vale lembrar o pensamento do escultor Brancusi: “Simplicidade é complexidade resolvida”. Mais imagens do projeto que transformou a residência e oficina do muralista aqui, e sobre o projeto, aqui.
Murales
Recentemente li este artigo por indicação de um professor, que comenta que “La incorporación de La Tallera no es solo un elogio a una arquitecta fundamental de la contemporaneidad o al muralismo como representación del arte mexicano”. David Alfaro Siqueiros, junto de José Clemente Orozco e Diego Rivera, foram três muralistas mexicanos que ficaram conhecidos como “Los Tres Grandes”. Vale lembrar que a pintura muralista começou como um movimento contra a pintura de cavalete, que era um ativo exclusivo da burguesia, sendo assim, sua apreciação poderia ser limitada não estando disponível ao público. Era uma pintura como forma de protesto e que se tornou um elemento integrado à arquitetura mexicana. Tanto é que quando foi expor no MoMA, na época que estava fazendo um mural comissionado por Rockefeller para o Rockefeller Center, Rivera teve de criar uma espécie de “mural portátil”, estabelecendo um atelier no museu para a criação destas obras.
Vale comentar que, recentemente, houve no Whitney museum uma exposição acerca da influência dos pintores mexicanos nos Estados Unidos, que incluem Orozco, Siqueiros e Rivera. Vida Americana: Mexican Muralists Remake American Art, 1925–1945, ficou em exibição de fevereiro de 2020 à janeiro de 2021 e os highlights desta exposição estão disponíveis aqui e uma crítica acerca da exposição aqui.
Arquitetura Mexicana
Conhecemos o México como a casa de arquitetos como Luís Barragán (Pritzker 1980), cujos trabalhos foram recentemente listados na Barragán Foundation, localizada na Suíça. Que adquiriu o acervo de Barragán em 1995, após a morte do arquiteto, e faz parte de uma holding, com o intuito de reunir os trabalhos do arquiteto em outros acervos, como no caso da Coleção Armando Salas Portugal. Haja vista a antiga inacessibilidade de seu acervo por décadas, em 2019, houve, no Tribeca Festival, a première do documentário acerca da incessante luta de uma artista em conseguir que esse acervo retornasse ao México - parece história de telenovela, mas é real e está documentada. Essa discussão acerca da transposição de acervos de artistas para outros países é complexa e extensa, não podendo ser reduzida à comentários simplistas. Recentemente vimos o acervo de Lúcio Costa ser doado pelo família à Casa de Arquitectura, em Portugal (quis incluir aqui este artigo de 27/10, sobre o envio de uma cópia da digitalização do acervo em Brasília). Paulo Mendes da Rocha, ainda em vida, doou seu acervo para a mesma instituição.
O primeiro livro de um arquiteto mexicano que comprei, ainda na faculdade, foi de Ricardo Legorreta, chamado Sonhos Construídos da coleção Educação do Olhar, da Editora Bei. (Preciso mencionar a influência?!). Resgatando a Newsletter #4: “O Arquiteto mexicano Ricardo Legorreta disse uma vez que não era só usar rosa numa arquitetura que a tornaria Mexicana.” Quis resgatar então dois artigos: The Architecture Of Emotion - Ricardo Legorreta Colors His World, do Washington Post e este que fala sobre o uso de rosa por Barragán (numa linguagem zero acadêmica rs) mas que menciona seu “diálogo transnacional” com Le Corbusier.
Não quis me estender acerca dos arquitetos e artistas icônicos para falar mais acerca do México contemporâneo. Aliás, México este que não é só da arquitetura de Frida, mas também da arquitetura residencial de Fernanda Canales, que recentemente deu uma palestra virtual na escola de arquitetura de Princeton com o título: Unlearning Architecture, das escolas e centros (acadêmicos ou comunitários) de Gabriela Carillo, da integração arquitetura e natureza de Tatiana Bilbao e das transformações e proposições de Gabriela Etchegaray, listada como uma das 26 mulheres que mudaram a arquitetura pelo portal Architizer. Considerada “problem solver”, após ter de reinventar uma obra incluindo uma fachada que não poderia ser demolida, ela enxergou o desafio como “uma oportunidade de desenvolver um design que re-interpreta o layout da edificação original”, como coloca este artigo da Dezeen. Recomendo a leitura deste outro artigo, cujo título já diz muito: Mauricio Rocha and Gabriela Carrillo: “It is Important Not to Doubt That Architecture is Art”.
Bom, eu acredito que arquitetura é arte; já comentei aqui sobre as artes maiores, e lá está a arquitetura, junto da pintura e da escultura. Acho que podemos encerrar por hoje!
Até breve!